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Quarta-feira, 12 de Fevereiro de 2025

Literatura

Vitória pela manipulação

É neste ponto o filme bem mais complexo e maduro que diversas obras que tratam deste tema.

Ensaios Literários
Por Ensaios Literários
Vitória pela manipulação
Iron Idem no noticiário
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   Quando se fala em domínio político, ou mesmo em disputas por uma determinada vertente, por um determinado caminho e forma de sociedade, normalmente aparecem junto questões ou militares ou institucionais. Há nelas uma relação um pouco mais direta, pois ganhando desta forma há um maior e mais óbvio domínio político. No entanto, a questão da informação e das ideias é também um bastante importante aspecto, pois determina bastante o que é pensado ou não.

     Em vários aspectos, há certa manipulação de diversas formas, hoje em dia mais pulverizada pelas redes sociais, mas ainda há métodos para se colocar tais pontos de maneira mais forte. Um filme muito bom nestes aspectos é o filme polonês de 1981: Guerra dos mundos: próximo século. Focado em um personagem, Iron Idem, um apresentador de um noticiário que se intitula independente, vemos como fica sua vida após a Polônia ser tomada pelos marcianos, que chegam e estabelecem um novo regime. Nesta nova forma, há a chamada Prova de Amizade, que consiste em ser registrado e essencialmente controlado pelos marcianos. Os cidadãos são também constantemente intimidados, sob a linguagem de se fazer voluntariamente, a doação de sangue.

     Como apresentador Iron Idem usa uma peruca loira, o que lhe distingue da aparência que tem na rua. Ambientado no “futuro” de 1999, há também um comentário sobre a chegada do novo século. Por determinação dos marcianos, no primeiro dia Iron deve ler um texto anunciando e celebrando a chegada deste. No próximo, com a casa tomada pela polícia sua esposa e levada. Há também uma tortura, para que ele faça a prova de amizade e se torne amigo dos marcianos.

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    Ao longo do filme, passa por diversas situações difíceis, como ficar em um abrigo e ter uma proposta para rever a esposa, de maneira fraudulenta. O ápice é seu final, fazendo um discurso expondo não apenas as ações da mídia, mas as próprias ações das pessoas, que se contentam passivamente com aquilo. Em comentário com isso, mais ao começo do filme, há uma cena entre ele e o dono da emissora onde o último afirma em resposta a Iron dizer que tudo tem um limite, que também tem um preço. Somos independentes para fazer o que queremos, no entanto há sempre um preço envolvido, que nem sempre é monetário.   

    É neste ponto o filme bem mais complexo e maduro que diversas obras que tratam deste tema. Pois aborda que tudo não se trata apenas de uma manipulação pura e simples das coisas, porque em verdade o manipulado muitas vezes sabe que o é, e se insere naquela lógica por ser a vida como conhece, a pessoa como é. E também, por tal vida estar inserida naquele sistema e lógica, também se há um preço para quebrá-la, normalmente o ostracismo e hostilidade, a marginalização e exclusão destes espaços, usualmente. Então nisto se revela a complexidade, por ser algo mais coletivo e que envolve em níveis profundos as vidas de cada um. O fato de ele apresentar o jornal de peruca reforça esta imagem, querendo ser uma persona na TV e uma pessoa na rua. Tentando assim afastar dois aspectos de sua vida.

    Dirigido por Piotr Szulkin e estrelando Roman Wilhelmi como Iron Idem, foi lançado em 1981, como um de seus filmes que fazem parábolas políticas através da ficção científica. Apesar de usar pelo título a referência ao livro de H G Wells, A Guerra dos Mundos, faz uma história bem diferente, com outra abordagem. Aqui, ao invés dos marcianos tentarem tomar a terra militarmente como no romance inglês, o faz por meio de manipulação e controle político. Por ser um filme da Polônia Soviética, lançado em 1981 e liberado no país em 1983, a associação mais direta seriam os soviéticos. No entanto, por não haver nenhuma crítica direta a qualquer regime da época, e os marcianos terem aspectos estéticos que lembram americanos, o filme torna-se um pouco anacrônico, valendo para várias coisas e épocas. Mas vale como obra para pensar a natureza da manipulação e no que ela está inserida.  

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