Naquele local, que lhe inspirava um exótico catolicismo, como se não soubesse direito os sentimentos e práticas católicas que ali estavam, embora também fosse da religião, mas parecia que não era muito parecida a energia, parecia não ter os mesmos sentimentos. Sentira-se acolhido por Pola, o chá estava fazendo muito bem, mas não lembrava as casas e as mulheres católicas brasileiras. Admirava que fosse ela caridosa, por ser católica, e assim ajudar os viajantes perdidos na floresta. Para ele, naquele momento, fora algo decisivo, que lhe salvara da morte.
A arma que carregava conseguia afastar lobos e algumas outras feras, mas não a maior de todas, que é a fome. Já começava a sentir aquilo vindo. Já mais aquecido e relaxado com a bebida e os cuidados da polaca conseguia prestar mais atenção no próprio corpo, vendo mais seus sinais e sintomas. Falou com ela que tinha fome, se ela não poderia ser bondosa mais uma vez e lhe dar um pouco de comida. Pola concordou imediatamente, dizendo que estava mesmo assando um leitão de seu quintal um pouco antes dele chegar. Balançando seus alaranjados fios loiros e seu esbelto corpo de meia idade foi ela pegar o animal que estava terminando de ser preparado.
O pôs na mesa, colocando o de barriga para cima, no caso a barriga aberta por onde passara o espeto para suspendê-lo acima do fogo e assá-lo dessa forma. O cheiro era ótimo, bem temperado e suculento, no ponto certo. O assara junto com algumas frutas, diversificando o prato. Chamou Francisco para vir. Sentou na cadeira. Balançava o brasileiro seus cabelos castanhos, emitindo um sorriso. Pediu um pedaço do lombo, aonde vinha um ótimo cheiro. O mordeu sentindo um ótimo e crocante sabor.
- A pele trincando, coisa bem boa- Disse ele.
- Quando a pele trinca e salta esta no ponto para ser saboreado, quer dizer que tudo já foi bem dourado e preparado. Só se deliciar e engolir. E sabia que a ciência tem descoberto que há uma grande proximidade biológica entre seres humanos e porcos? São mais parecidos do que supúnhamos. - Respondeu Pola.
Sem se importar muito com os comentários científicos da camponesa polonesa, comeu bastante leitão assado o rapaz, com algumas partes das costas e também uma das pernas. Não era ainda um homem atlético, mas ainda magro. Queria ser forte e musculoso, bem macho como pensava, mas ainda estava longe deste ponto. Fazia academia, mas nada tinha vindo ainda. E na Polônia se descuidara um pouco. Comera um pouco as comidas locais, terminando agora no leitão de Pola. Estava mais gordinho, porém pouca coisa.
Era ainda meio dia, o sol estava aparecendo. Voltou com a ideia de subir a Lysica, para poder ver o local aonde queria ir. Conversou com Pola sobre isto, ela aceitou, mas teria de ser mais tarde. Queria descansar um pouco, mas perto do anoitecer o levava ao topo em seu carro. Conhecia um atalho que em duas horas estariam lá. Com o ego masculino levemente incomodado, mas sentindo valer à pena, pois muito pouco sabia daquele local e como nele se guiar, além de estar gostando da companhia de Pola, Francisco aceitou. Foi a mulher dormir um pouco, o deixando ficar na sala.
Resolveu então olhar mais um pouco a casa. Havia muitos gatos por ali, a maioria deles simpáticos. Ficara ainda meio mexido com aquelas imagens em cima da lareira, ainda não entendendo completamente sobre elas. Já as vira muitas vezes na vida, várias bem parecidas com aquelas mesmas. Ainda assim, algo nelas não encaixava, as sensações eram dispersas e estranhas, não sabia dizer o que era. Sentia um exotismo pairando sobre o ar, sobre todo o local, a bem da verdade. No fim aquelas sensações tornavam-se apenas um emaranhado de coisas e ideias na cabeça que não conseguia entender ou saber o que eram. Decidiu que conversaria mais com Pola sobre isto, saber se tinha alguma relação com aquele ambiente. Aprendera algumas coisas no The Witcher, mas sentia que ainda tinha muito pouca informação sobre aquele lugar.
Sem ir até o quarto onde ela dormia, foi para a cozinha e o quintal. Tinha um cheiro estranho, mas até bom aquela cozinha. Tinha fogão, geladeira e pia. Bem normal. Cheiros de cozinha podem ser estranhos, variando muito por causa dos pratos e temperos que cada local e pessoa têm, dando diferentes formas na arte gastronômica. O quintal tinha alguns porcos, de onde viera o leitão e mais algumas galinhas. Parte do que tinha ela tirava dali. A montanha ao fundo dava um ar solene e bucólico para aquela casa, no meio da Polônia. Descansou mais um pouco, agora sem fazer mais nada. Apolônia então acordou.
Francisco estranhou que estivesse ela com uma túnica que cobria todo seu corpo e mais um xale vazado sob os ombros. A cabeça estava descoberta, com seu cabelo bem a vista. Questionou ele a maneira como estava vestida. Respondeu ela que sua religião pedia que, subindo naquela montanha estivesse devidamente vestida, não mostrasse demais. Ele sentiu uma solenidade na fala da anfitriã e apenas concordou. Achou-a uma mulher de respeito. Foi para o carro dela, um Voyage dos anos 2000. Começaram a subir a montanha, por uma íngreme estrada de terra.
Conforme subia, ia sentindo o clima mudar. Não apenas a temperatura, que já baixava por questões naturais, mas também as próprias sensações, o ambiente. Sentia os mistérios da vida, dos feitiços, poderes e fatores ocultos que estão presentes. Aquilo era um local como onde nunca estivera. Sentia como se bruxas e outras criaturas estivessem em sua volta. Pola dirigia tranquilamente. Uma camponesa perto da montanha devia conhecer já muito bem aquele local e as suas características. Em alguns momentos sentia um leve medo, talvez pelo que era emanado por lá, mas principalmente adrenalina e uma forte sensação de poder e força, por estar desbravando aquele local. Se sentindo o próprio The Witcher, gritava e admirava com força tudo aquilo.
- Calma soldado!- Exclamou Pola de repente.
Rapidamente a corrigiu, dizendo que na verdade era tenente, um posto ainda baixo, mas com muito mais prestígio, sendo já um oficial do exército brasileiro. Sem dar bola para a correção, seguiu ela dirigindo. Cada vez mais que subiam ficava cada vez mais estranho. Estavam já no lusco fusco àquela hora, eles já alto na montanha. As sombras aumentavam, mas ainda era possível distinguir as formas. Sentia-se dentro de histórias fantásticas lá em cima, o jovem. Quanto mais subiam, mais sentia o local ficando estranho. Quis então saber se haviam muitas lendas e histórias por lá.
Pola contou, dizendo que antigamente se dizia que vagavam bruxas por lá. Contava-se que elas saiam à noite, vagavam e faziam seus rituais noturnos, conhecidos como sabás. E que também caçavam e comiam as crianças da vila. Com o aumento do catolicismo por lá elas começaram a diminuir, afastadas pelos sons dos sinos que os monges tocavam. Os católicos as tinham expulsado, tirando suas maldades de perto. Mas as vilas tinham se desmanchado, sobrando apenas esparsas casas como a dela, por ainda temerem que elas voltassem. Sabendo da energia e das coisas ruins que vinham destas mulheres, tinha ela muita força e fé em Cristo e Nossa Senhora, a mãe de todas, àquela protetora contra as maldades. Por isso assim se vestia, de maneira respeitosa para subir aquele local. Dissera também que tal história inspirara Modest Mussorgsky na composição de Noite na Montanha Careca, espelhada naquele local. Cada vez mais Francisco ficava fascinado com o que escutava. Aquele local o deixava um tanto maravilhado e intrigado com seus mistérios e atmosferas.
Já noite, começo dela, mas bastante escuro já, chegaram ao topo. Tinha ali alguns ossos, não conseguia ver direito do que. Próximo a uma pedra havia um lampião, que Apolônia acendeu para irem andando. Sobre os ossos, disse ela, deviam ser de animais, destes que morrem por aí ou são às vezes caçados. O topo da montanha careca dava calafrios em Francisco Chagas, mas mantinha a compostura como se estivesse em missão.
Disse Pola estarem em um dos locais de maior religiosidade e força espiritual da Polônia. Sentia ele então uma naturalidade naquelas sensações, como se vários espíritos e santos, talvez até mesmo Deus, o estivessem visitando e lhe aparecendo agora. Viu que havia uma gruta em uma das partes. Quis Francisco ir lá. Pola disse ser um dos principais locais, onde a força e aproximação maior aconteciam. Entraram no local.
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