Em relação a questões morais, uma frase bastante recorrente, muito atribuída ao romance “Os Irmãos Karamazov” de Fiodor Dostoievski, é a de que “Se Deus não existe tudo é permitido”. Embora seja discutida a atribuição literária desta frase seja discutida se real ou não, a frase pegou e virou um senso comum na literatura, psicologia e, em alguns casos, teologia. Nela, se ganha valor ao se dizer que o que não é permitido possui relação direta com o que Deus permitiria ou não. E sua ausência tornaria imoral o mundo, na medida em que se poderia fazer qualquer coisa.
Tal frase foi também já usada por ateus, como uma crítica a moralidade cristã. A qual, embasada nesta frase, faria o certo apenas porque uma entidade ou algo punitivo estaria vigiando e impedindo. Portanto tal moralidade não estaria embasada em uma coisa ser boa ou ruim, mas simplesmente num medo de sofrer uma punição ou sanção por parte de uma força maior. Neste aspecto, ver Deus apenas como este balizador moral, como determinador do certo e errado o torna reducionista. Embora haja conceitos e realidades em torno das chamadas leis divinas, elas são um tanto mais permissivas e abertas. O que não torna necessariamente boas as coisas que ali são feitas, mas não há uma proibição direta em relação ao fazer aquilo. O que se deve antes de tudo é entender a base e a natureza delas, portanto assim se podendo definir se é bom ou se é ruim.
A melhor frase a este respeito é a famosa frase de Paulo de Tarso em sua carta aos coríntios: tudo é lícito, mas nem tudo convém. Ao assim falar, Paulo consegue trazer a tona toda a mais básica questão envolvido entre aquilo permitido por Deus. Em verdade, e em virtude do livre arbítrio, Deus tudo permite que seja feito, fazendo com que as coisas boas e ruins fluam de maneira igual. A qual são consequência das decisões humanas, que fazem coisas que lhes são lícitas, mas muitas vezes não convém. E assim sendo, ainda podem ser feitas. Mas não será bom que lhe seja.
Quando Nietzsche tentou superar as noções de bem e mau, não conseguiu. Pois tais conceitos são ainda bastante sólidos e dizem respeito fortemente às decisões e caminhos humanos. Pois nossas ações e consequências, bem como a realidade que nos cerca são ainda muito marcadas por aquilo que é bem e mau. E a questão não seria propriamente uma superação destes conceitos, mas entendê-los em suas mais densas complexidades. Os conceitos deste são ainda firmes, com profundos significados, mas os objetos, ações que sobre eles recaem podem adquirir diferentes aspectos ou serem outras coisas. Pelo que se é definido e no que se embasa algo pode ser ou deixar de ser conveniente. Tal visão passa diretamente por esta noção de moral, associado com as complexidades de Deus como a raiz do universo, a causa primeira das coisas. Em verdade, Deus existe e tudo é permitido. Mas nem tudo convém.
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